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09
agosto
2016

Precisamos reconquistar as ruas

ANDERSON BALTAR

anderson-baltarA partir desta terça-feira, como mais um dos eventos paralelos aos Jogos Olímpicos, as doze escolas do Grupo Especial estarão no Boulevard Olímpico para inéditos desfiles ao lado de alguns dos mais tradicionais blocos de Carnaval da cidade. A iniciativa, denominada “Encontro de Carnavais”, partiu da Prefeitura e é bastante apropriada. Ela estimula o clima de festa na cidade, promove o encontro das duas principais vertentes da folia carioca – que hoje são praticamente inconciliáveis – e, acima de tudo, pode fazer germinar uma semente que considero fundamental: a certeza de que um desfile só por ano é muito pouco para o que as escolas de samba representam para a vida cultural dessa cidade.

Como brilhantemente Alexandre Medeiros expôs em seu blog na semana passada, há cerca de 50 anos era bastante comum as escolas de samba participarem de disputas e cortejos em eventos fora de época. Em competições paralelas, as agremiações mantinham-se vivas no imaginário da cidade durante outras épocas do ano e tinham a possibilidade de atrair novos adeptos.

Hoje em dia, falar em desfile fora de época é quase uma ofensa para os dirigentes da festa. Me recordo que, em 1994, por ocasião da Copa do Mundo, uma cervejaria chegou a propor uma competição entre as escolas, trazendo até agremiações de outros estados. Proposta rechaçada. Anos depois, com o auge das micaretas, surgiram sondagens para que os grêmios se apresentassem como os principais grupos baianos fazem, com trios elétricos. Nem pensar. Segundo os dirigentes, tudo deve ser voltado para o desfile de Carnaval. Em sua linha de raciocínio, qualquer outro evento fora do calendário serviria para que o interesse pela festa diminuísse. E aí, evidentemente, cairiam a verba da televisão, vendas de ingressos e CDs e etc.

Eu penso diferente. Justamente toda a canalização de esforços para um evento único tem feito as escolas de samba cada vez mais se fragilizarem como entidades congregadoras do convívio de suas comunidades. Em nome da disputa anual, da nota máxima, da perfeição dos jurados, não se abre espaço para novas iniciativas e experiências. Para que buscar novos amantes, se as 2.500 vagas em alas de comunidade são preenchidas com um simples recadastramento dos componentes do ano anterior?

Seria altamente salutar para as escolas um calendário de eventos ao longo do ano, com competições pontuais como de sambas de terreiro, torneios de baterias e até um desfile fora de época, no inverno (evidentemente, sem o mesmo aparato cênico do desfile oficial). Quantos amigos e conhecidos que moram em outros estados e países gostariam de visitar o Rio ao longo do ano e participar de eventos dessa natureza? Quantos novos torcedores as escolas de samba poderiam agregar se elas estivessem mais presentes no cotidiano anual da cidade? Não seria mais fácil obter mídia e patrocínios  se existissem outras oportunidades para que as marcas pudessem ser atreladas às agremiações?

Que o “Encontro de Carnavais” seja bem sucedido. Que multidões sejam arrastadas para uma folia popular pouco vista nesta cidade. E que seus efeitos arejem as mentes dos dirigentes de nossa maior festa.

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